Eu pisco os olhos um pouco mais forte para ver se recobro a anestesia de mim. Eu olho isto que restou de mim através do espelho meio embaçado, meio sujo, e de repente me dou conta que talvez sejam meus olhos que estejam inebriados. Um borrão de mim e nenhum suspiro aliviada meu peito.

Olho pras janelas distantes e o abismo entre o mundo e eu parece ainda mais intransponível. Por deus, como pode uma distância tão humanamente percorrível parecer um desafio que pouco ou nada valerá?

Mas são os reflexos turvos nos vidros estilhaçados que permanecem refletindo. São minha imagens tortas, meus olhos torpes, meu desajuste nesse sórdido eu que anda refletindo por aí que me entristecem a alma. É este cansaço em existir sem nunca, de fato, pertencer a nada. Um corpo se esgueirando das almas todas, dos corpos todos, da porra de um repouso sossegado em si mesma. Um dia acreditara que viver era feito flanar entre os suspiros alheios e incontroláveis desejos. Bobagem, viver é se olhar com ombros curvados, apagada pelas manchas do vidro. É se ver dispersa entre um reflexo que, quiçá, é seu, que não te contempla, não te sossega, não te alimenta. Um não estar em si e em nada mais.

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