Te quis em cigarros acesos, risadas contidas

Tô te deixando em repouso bem aqui no peito. Não que por um segundo sequer você tenha deixado de me habitar. Mas, aos poucos, num processo lento e doloroso – ainda que repentino e sofrido -, você mudou a forma de me habitar.

Por deus, te amo. Hei de continuar a amar-te. Só que não posso mais suportar o peso desse afeto em meus ombros. Ou da falta dele. Ainda amo cada átomo, cada fragmento, cada toque de seus dedos. Mas sou incapaz de gostar de você. Pois, pequena, os dias são somatórias complexas de afeto e amor, desejo e solidão. Te amo, só não te preciso mais.

Logo eu que sempre precisei daqueles afetos abandonáveis, esquecíveis – ainda que por poucos dias. Só sei amar alguém que eu tenha a capacidade de abandonar e sentir saudades e fazer a falta destroçar meu eu. Assim, e só assim, o amor se reconstituí, retorna para meus bolsos, se faz presente em meus ensejos.

Você me foi moradia afetuosa por dias sem fim. Te amei de corpo, alma e essência. Te carreguei no mais puro ato de desejar-te. E te guardei em minhas entranhas. Te almejei em fins de tarde, em cinema mudo, em cafés quentes. Te quis em cigarros acesos, risadas contidas, te quis em meus toques em teu corpo. Em dia frios. Alegrias escancaradas.

Agora te amo de longe. Te amo pelo que me foste, mas não mais pelo que me és. Resolvi que é hora do amor por ti consolidar-se no que fora e não voltará a ser. Você fica em mim. Com retratos de risos doces, olhos encantados, desejos de toques e retoques de afeto. Mas agora seus cafés me amargam a boca, seus perfumes me escapam a essência correta. Te deixo, por fim, aqui. Em meu peito, onde um amor nasce e hei de permanecer. Te amo, mas mantenho afeto pelo retrato do que fomos e já não somos.